segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

A tendenciosa reportagem do Fantástico em prol da Transposição do Velho Chico


O programa Fantástico, da Rede Globo de Televisão, domingo (20) exibiu uma reportagem extremamente tendenciosa sobre o polêmico projeto de “Transposição” das águas do rio São Francisco. A repórter Sônia Bridi mostrou enganosamente que esta famigerada obra é a única saída para o problema da seca que continuamente castiga o sertão nordestino. Com a minha considerável experiência de profissional de imprensa, não tenho a menor dúvida que a reportagem fora publicada a serviço de algum setor do Governo Federal ou do mafioso cartel formado por empresários do ramo e políticos corruptos e inescrupulosos.
Não é de agora as polêmicas discussões sobre este nefasto projeto que trará incalculáveis prejuízos às populações que margeiam o rio, uma vez que o Velho Chico encontra-se fragilizado, na UTI, precisando urgentemente de ações para salvá-lo da iminente morte anunciada por ambientalistas, estudiosos e usuários. O São Francisco, outrora “Tão grande quanto o mar”, hoje não passa de um rio combalido, controlado pela mão do homem e que já perdeu mais de 90% de suas espécies e matas ciliares.
Na realidade, o nosso rio é vítima da insana ambição política que viu na construção de barragens – Três Marias, Sobradinho, Itaparica, Paulo Afonso, Xingó – a saída para o nosso País, sem pensar sequer nos sérios impactos ambientais e nos dantescos danos que estas obras provocariam.
Não há como negar estas hidrelétricas geram grande e importante quantidade de energia, porém, paralelamente,  geram destruição, miséria e desesperança para os moradores ribeirinhos, pois a partir de suas construções todas as lagoas secaram, a produção de arroz desapareceu, a economia dos municípios afundou e a cultura dos povos ribeirinhos empobreceu.  Os prejuízos materiais e intelectuais são incalculáveis em decorrência da violenta agressão ao “rio da unidade nacional” que banha cinco estados brasileiros – Minas Gerais, Bahia, Pernambuco, Alagoas, Sergipe –  por ser genuinamente brasileiro.
Para atender interesses de uma minoria dominante de ricos fazendeiros dos estados onde o projeto visa beneficiar, incluindo no rol dos pretensos contemplados o ex-ministro e latifundiário Ciro Gomes, o projeto vem sendo tocado com muitas falhas, demora na liberação de recursos, atraso no cronograma de obras e superfaturamento de preços, pois a previsão era de investimentos da ordem de R$ 4,5 bilhões para concluir a obra e hoje são necessários  quase R$  8 bilhões. E mais uma etapa da obra teve ordem de serviço assinada  segunda-feira (21), pelo ministro da Integração Nacional, Fernando Bezerra.
No tocante ao ousado e catastrófico projeto, não vejo nenhuma novidade nos descasos elencados na reportagem, pois o que esperar neste País campeão em escândalos de corrupção? Embora recheada de denúncias, o objetivo da matéria foi gerar comoção social para justificar a liberação imediata de mais um lote de recursos milionários cujo valor é de R$ 394 milhões e que através de um propinoduto chegará a seu destino completamente depenado por políticos ardilosos e empresários desonestos da construção civil, os quais costumeiramente e em ocasiões como esta, de dentro de seus gabinetes e escritórios, assaltam os cidadãos nacionais pagadores de impostos.
De fato, o sertão nordestino vive a pior seca dos últimos 40 anos. Em cidades como Cabrobó e outras do Cariri, onde a seca está devorando tudo, a situação é muito mais grave, embora não podemos deixar de reconhecer que os rebanhos (bovinos, caprinos e ovinos) também estão sendo dizimados pela seca no semiárido de Alagoas, Sergipe e Bahia, também. Há lugares em que muitos moradores rurais estão matando a fome com palma, mandacaru e macambira queimados porque não têm o que comer. Esses miseráveis vivem em completo esquecimento, longe da civilização, sem luz e sem água, e ainda não foram contemplados pelo Fome Zero, infelizmente.
A repórter Sônia Bridi e o cinegrafista Paulo Zero percorreram mais de mil quilômetros pelo sertão do Nordeste, em mais uma reportagem da série “Brasil: Quem paga é Você”. Mostraram a dura realidade dos habitantes rurais e os contínuos erros da obra, porém, deixaram de mostrar que o Velho Chico é um paciente que se encontra no leito de morte e não possui a menor condição de fazer doação de sangue.
Sobre a lentidão da obra, torçamos para que jamais seja concluída, para que o nosso o Velho Chico tenha os seus dias prolongados. Para os amantes do Velho Chico bom mesmo seria que a obra de Transposição do rio São Francisco não passasse de mais um elefante branco, isto é, passasse para o rol de milhares de obras inacabadas no Brasil e que servem exclusivamente para enriquecer ainda mais os que já são ricos a custa da sangria do dinheiro público.
O rio São Francisco jamais pode ser visto como o grande exterminador da seca porque esta é um fenômeno climático que jamais desaparecerá do semiárido nordestino. Falar em acabar com a seca é autêntica utopia e faz parte dos discursos demagógicos de políticos corruptos que alimentam a chamada indústria da seca em nosso País. E é oportuno lembrar que o festival de discursos demagógicos prometendo acabar com este fenômeno climático teve início quando Sua Majestade Imperador Dom Pedro II prometeu vender, caso fosse necessário, a última pedra preciosa da coroa. A história mostra que a coroa permaneceu intacta e pouquíssimas ações foram viabilizadas pelo sapiente imperador.
Urge ações no semiárido nordestino que prepararem os sertanejos para conviver com as constantes estiagens. As ações emergentes devem ser substituídas pelas eficazes ações permanentes, pois o Brasil é rico em tecnologia e recursos naturais e o Nordeste é uma partícula importante deste País.
Portanto, não sou a favor da sangria do dinheiro público e dos desmandos governamentais – a minha história de vida e o meu patrimônio por si só provam a autenticidade das minhas palavras – porém em se tratando do rio São Francisco, na condição de amante do Velho Chico e morador ribeirinho que acompanha bem de perto o processo de assoreamento do ex-Opara, torço para que esta nefasta obra jamais seja concluída, pois sou a favor, sim, do Projeto de Revitalização cujas obras não passam de discursos e promessas.

Um comentário:

  1. Me orgulho em fazer parte de um grupo de blogueiros que tem pessoas do seu calibre, excelente texto. Valeu Hélio.

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