O programa
Fantástico, da Rede Globo de Televisão, domingo (20) exibiu uma reportagem extremamente
tendenciosa sobre o polêmico projeto de “Transposição” das águas do rio São
Francisco. A repórter Sônia Bridi mostrou enganosamente que esta famigerada
obra é a única saída para o problema da seca que continuamente castiga o sertão
nordestino. Com a minha considerável experiência de profissional de imprensa,
não tenho a menor dúvida que a reportagem fora publicada a serviço de algum
setor do Governo Federal ou do mafioso cartel formado por empresários do ramo e
políticos corruptos e inescrupulosos.
Não é de agora
as polêmicas discussões sobre este nefasto projeto que trará incalculáveis
prejuízos às populações que margeiam o rio, uma vez que o Velho Chico
encontra-se fragilizado, na UTI, precisando urgentemente de ações para salvá-lo
da iminente morte anunciada por ambientalistas, estudiosos e usuários. O São
Francisco, outrora “Tão grande quanto o mar”, hoje não passa de um rio
combalido, controlado pela mão do homem e que já perdeu mais de 90% de suas
espécies e matas ciliares.
Na realidade,
o nosso rio é vítima da insana ambição política que viu na construção de
barragens – Três Marias, Sobradinho, Itaparica, Paulo Afonso, Xingó – a saída
para o nosso País, sem pensar sequer nos sérios impactos ambientais e nos
dantescos danos que estas obras provocariam.
Não há como
negar estas hidrelétricas geram grande e importante quantidade de energia,
porém, paralelamente, geram destruição,
miséria e desesperança para os moradores ribeirinhos, pois a partir de suas
construções todas as lagoas secaram, a produção de arroz desapareceu, a
economia dos municípios afundou e a cultura dos povos ribeirinhos empobreceu. Os prejuízos materiais e intelectuais são
incalculáveis em decorrência da violenta agressão ao “rio da unidade nacional”
que banha cinco estados brasileiros – Minas Gerais, Bahia, Pernambuco, Alagoas,
Sergipe – por ser genuinamente brasileiro.
Para atender
interesses de uma minoria dominante de ricos fazendeiros dos estados onde o
projeto visa beneficiar, incluindo no rol dos pretensos contemplados o
ex-ministro e latifundiário Ciro Gomes, o projeto vem sendo tocado com muitas falhas,
demora na liberação de recursos, atraso no cronograma de obras e
superfaturamento de preços, pois a previsão era de investimentos da ordem de R$
4,5 bilhões para concluir a obra e hoje são necessários quase R$
8 bilhões. E mais uma etapa da obra teve ordem de serviço assinada segunda-feira (21), pelo ministro da
Integração Nacional, Fernando Bezerra.
No tocante ao ousado
e catastrófico projeto, não vejo nenhuma novidade nos descasos elencados na
reportagem, pois o que esperar neste País campeão em escândalos de corrupção?
Embora recheada de denúncias, o objetivo da matéria foi gerar comoção social
para justificar a liberação imediata de mais um lote de recursos milionários
cujo valor é de R$ 394 milhões e que através de um propinoduto chegará a seu
destino completamente depenado por políticos ardilosos e empresários desonestos
da construção civil, os quais costumeiramente e em ocasiões como esta, de
dentro de seus gabinetes e escritórios, assaltam os cidadãos nacionais
pagadores de impostos.
De fato, o sertão
nordestino vive a pior seca dos últimos 40 anos. Em cidades como Cabrobó e
outras do Cariri, onde a seca está devorando tudo, a situação é muito mais
grave, embora não podemos deixar de reconhecer que os rebanhos (bovinos,
caprinos e ovinos) também estão sendo dizimados pela seca no semiárido de
Alagoas, Sergipe e Bahia, também. Há lugares em que muitos moradores rurais
estão matando a fome com palma, mandacaru e macambira queimados porque não têm
o que comer. Esses miseráveis vivem em completo esquecimento, longe da
civilização, sem luz e sem água, e ainda não foram contemplados pelo Fome Zero,
infelizmente.
A repórter
Sônia Bridi e o cinegrafista Paulo Zero percorreram mais de mil quilômetros
pelo sertão do Nordeste, em mais uma reportagem da série “Brasil: Quem paga é
Você”. Mostraram a dura realidade dos habitantes rurais e os contínuos erros da
obra, porém, deixaram de mostrar que o Velho Chico é um paciente que se encontra
no leito de morte e não possui a menor condição de fazer doação de sangue.
Sobre a
lentidão da obra, torçamos para que jamais seja concluída, para que o nosso o
Velho Chico tenha os seus dias prolongados. Para os amantes do Velho Chico bom
mesmo seria que a obra de Transposição do rio São Francisco não passasse de
mais um elefante branco, isto é, passasse para o rol de milhares de obras
inacabadas no Brasil e que servem exclusivamente para enriquecer ainda mais os
que já são ricos a custa da sangria do dinheiro público.
O rio São
Francisco jamais pode ser visto como o grande exterminador da seca porque esta
é um fenômeno climático que jamais desaparecerá do semiárido nordestino. Falar
em acabar com a seca é autêntica utopia e faz parte dos discursos demagógicos
de políticos corruptos que alimentam a chamada indústria da seca em nosso País.
E é oportuno lembrar que o festival de discursos demagógicos prometendo acabar
com este fenômeno climático teve início quando Sua Majestade Imperador Dom
Pedro II prometeu vender, caso fosse necessário, a última pedra preciosa da coroa.
A história mostra que a coroa permaneceu intacta e pouquíssimas ações foram
viabilizadas pelo sapiente imperador.
Urge ações no
semiárido nordestino que prepararem os sertanejos para conviver com as constantes
estiagens. As ações emergentes devem ser substituídas pelas eficazes ações
permanentes, pois o Brasil é rico em tecnologia e recursos naturais e o
Nordeste é uma partícula importante deste País.
Portanto, não
sou a favor da sangria do dinheiro público e dos desmandos governamentais – a
minha história de vida e o meu patrimônio por si só provam a autenticidade das
minhas palavras – porém em se tratando do rio São Francisco, na condição de
amante do Velho Chico e morador ribeirinho que acompanha bem de perto o
processo de assoreamento do ex-Opara, torço para que esta nefasta obra jamais
seja concluída, pois sou a favor, sim, do Projeto de Revitalização cujas obras
não passam de discursos e promessas.